O Direito à Morte Digna

Autor: Nehemias Domingos de Melo

RESUMO: O presente trabalho tem como objetivo fazer um paralelo entre o direito a uma vida com dignidade e o direito a morrer com a mesma dignidade. Faremos também um estudo comparado com o direito de outras nações, atinente à mesma matéria. Iremos também questionar até onde vai o poder do Estado para tornar a vida de uma pessoa uma obrigação, impedindo que essa pessoa possa ter uma morte com dignidade. Por fim, abordaremos a falta de legislação no Brasil regulando essa matéria, bem como a iniciativa do Conselho Federal de Medicina tratando do testamento vital.


PALAVRAS-CHAVE: Vida. Morte. Dignidade. Direito. Eutanásia.

Revista de Publicação: Revista Brasileira de Direitos Humanos Nº 36 – Jan-Mar/2021 – Doutrina

 

Introdução – O Direito à Vida como Direito Humano Fundamental


O direito à vida é direito fundamental do ser humano. Protege-se a vida mesmo quando o seu titular tenta tirá-la. Esse direito é garantido em todas as legislações modernas do mundo, como razão da existência do ser humano com capacidade de fruir de todos os demais direitos, podendo-se até afirmar que sem proteção do direito à vida não haveria sentido proteger-se os outros demais direitos.

No nosso sistema jurídico, a proteção à vida tem status constitucional (CF, art. 5º, caput) e permeia todo o sistema normativo brasileiro, tanto no âmbito civil quanto penal, protegendo-se, inclusive, as tentativas contra a integridade física dos indivíduos [1].


Como doutrina Alexandre de Moraes, o direito à vida é o mais importante de todos os direitos, sendo ele direito fundamental, e constitui-se em pré-requisito a existência e exercício de todos os demais direitos constitucionalmente assegurados [2].


O direito à vida insere-se entre os direitos fundamentais da pessoa humana. É um direito natural por excelência que o Direito Positivo deve reconhecer e proteger. Hoje, é considerado um direito universal, estando positivado nas legislações constitucionais dos países, especialmente depois da proclamação dessa garantia no artigo 3º da Declaração Universal dos Direitos Humanos (ONU), de 1948.


Na legislação de alguns países como o Brasil, essa proteção começa antes mesmo do nascimento. Nossa legislação protege o nascituro, como o embrião de uma vida e essa proteção se estende para até depois da morte do indivíduo, tendo em vista a proteção ao corpo morto e à própria honra do falecido.


Porém, o direito à vida não é absoluto, como de resto nenhum direito pode ser. Basta dizer que a legítima defesa excepciona essa proteção, pois em determinadas hipóteses a lei autoriza que alguém em defesa de sua própria vida possa tirar a vida de outra pessoa.

Quer dizer, em qualquer sistema jurídico não existe direito absoluto, pois do confronto entre duas garantias legais, o intérprete terá que relativizar uma para fazer valer a outra frente ao caso concreto.

Nesse cenário, a morte é parte de vida. Como preleciona a grande jurista Argentina Matilde Zavala de González, “la muerte propia y a la ajena son parte de la vida, en tanto la limitan, como en un camino que llega hasta determinado punto; y ese conocimiento sobre la inexorable mortalidad impregna de sentido los momentos vividos” [3]

Assim, se a morte é parte da vida e o direito à vida implica uma garantia de uma vida com dignidade, temos como corolário que o direito à vida digna não se resume ao nascer, ao manter-se vivo ou mesmo lutar pela continuação da vida, pois tal direito vai muito além, devendo-se, inclusive, respeitar a dignidade do direito de morrer [4].

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